Alterações na pensão alimentícia em decorrência da pandemia do Coronavírus

O valor a ser pago a título de pensão alimentícia só poderá ser alterado por meio de decisão judicial. Ainda que seja possível ao devedor provar que houve uma diminuição na sua renda, em virtude da crise decorrente da pandemia do coronavirus, não sendo ela suficiente para arcar com o pagamento integral da pensão, ou a comprovação do aumento da necessidade do alimentando, a obrigação do pagamento persiste enquanto não houver uma decisão judicial que altere o valor da pensão. A propositura da ação revisional é a única forma de o devedor alterar o pagamento da pensão alimentícia sem sofrer as consequências de uma execução decorrente de débito alimentar, quais sejam, a penhora de seus bens e até a prisão civil.

As medidas de distanciamento social, indispensáveis para conter a proliferação do coronavírus, já duram 5 (cinco) meses no Brasil. E, aqui como em todo mundo, as consequências econômicas do vírus têm sido consideradas tão graves quanto a doença em si.

Em 02 de julho de 2020 o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) publicou dados que demonstram os efeitos  da  pandemia  sobre  os  rendimentos do trabalho e o impacto do auxílio emergencial[1]. Os dados demonstram que o mês de maio foi marcado tanto pelo pico de casos de COVID-19 quanto pela maior queda média nos rendimentos, para 82% da renda habitualmente recebida. Os dados demonstram também que os trabalhadores autônomos foram uma das categorias mais afetadas pela crise econômica, tendo a renda média diminuída para apenas 60% da normal.

Dentre os diversos compromissos financeiros que ficam prejudicados com a queda da renda, abordaremos um que merece atenção redobrada: o pagamento de pensão alimentícia fixada por decisão judicial.

A pensão alimentícia, paga pelo genitor que não possui a guarda dos filhos, não tem um valor fixo na legislação brasileira, sendo definido, em cada caso concreto, levando-se em consideração dois fatores: a necessidade do alimentando (ou seja, o gasto médio dos alimentandos com necessidades básicas como alimentação, saúde, educação, moradia, lazer, etc) e a possibilidade do genitor (a capacidade econômica de pagar um valor sem prejudicar sua própria sobrevivência). Importante ressaltar que, em se tratando de pensão para os filhos, a obrigação existirá mesmo que o genitor esteja desempregado, já que o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) é clara ao estabelecer que aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores.

Em um quadro de incertezas gerado pela pandemia do coronavírus, as condições de vida podem influenciar nos dois vetores do binômio necessidade/possibilidade. Tanto pode-se ter um aumento na necessidade dos alimentandos, em casos, por exemplo, nos quais o genitor que tem a guarda perde seus proventos, ou mesmo a infecção pelo vírus aumenta os gastos de saúde, quanto o devedor pode ter uma diminuição drástica de sua renda, não tendo a mesma capacidade econômica para arcar com a obrigação assumida.

Em todo caso, o valor a ser pago a título de pensão alimentícia só poderá ser alterado por meio de decisão judicial. Ou seja, ainda que seja possível ao devedor provar que houve uma diminuição na sua renda, não sendo ela suficiente para arcar com o pagamento integral da pensão, ou a comprovação do aumento da necessidade do alimentando, a obrigação do pagamento persiste enquanto não houver uma decisão judicial que altere o valor da pensão.

Assim, caso haja alteração no binômio necessidade/possibilidade, a parte interessada na alteração do valor da pensão deve ingressar com uma ação revisional de pensão alimentícia, visando obter sentença que altere a obrigação alimentar.

Importante ressaltar que as partes, provedor e alimentandos, ou seu genitor guardião, podem chegar a um acordo sobre o novo valor a ser pago. Mas, de toda forma, referido acordo deve ser homologado pelo judiciário, sendo indispensável a propositura da ação revisional.

A propositura da ação revisional é a única forma de o devedor alterar o pagamento da pensão alimentícia sem sofrer as consequências de uma execução decorrente de débito alimentar, quais sejam, a penhora de seus bens e até a prisão civil.

Em 10 de junho de 2020 foi sancionada a Lei nº 14.010, que dispõe sobre o regime jurídico emergencial e transitório das relações jurídicas de Direito Privado no período da pandemia do coronavírus, Dentre outras medidas, a lei estabelece que a prisão civil por dívida alimentícia deverá ser cumprida em regime domiciliar até o dia 30 de outubro, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações. Ou seja, ainda é possível decretar a prisão do devedor, mas essa será cumprida em regime domiciliar. Ademais, permanece, em todo caso, a autorização para a realização dos demais atos constritivos da execução, como a penhora de bens e valores, inclusive sendo possível a penhora dos valores decorrentes de benefícios sociais, como o próprio auxílio emergencial, como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Habeas Corpus 568.021.

Assim, é fundamental que, havendo alteração na capacidade econômica do devedor de pensão alimentícia, ou na necessidade do alimentando, o interessado procure um advogado para ingressar com a ação de revisão de pensão alimentícia, sem deixar de pagar o quanto devido até nova decisão judicial, para evitar a penhora de seus bens e rendimentos, e mesmo a decretação da prisão civil.

 O escritório Couto, Lourenço & Miranda está à disposição para fornecer orientação e o auxílio necessário para a melhor condução da situação.


[1] CARVALHO, Sandro Sacchet de. Os efeitos da pandemia sobre os rendimentos do trabalho e o impacto do auxílio emergencial: o que dizem os microdados da PNAD covid-19. Carta de Conjuntura, n. 48, 3º trimestre de 2020. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/conjuntura/200702_cc_48_mercado_de_trabalho.pdf